esses atentados do eta em madrid me arrepiaram o espinhaço. tive meu "batismo" com o grupo separatista hidrófobo em 1997, quando estava dando uns bordejos pela espanha, atrás de touradas, andaluzas e resquícios da ocupação muçulmana (não necessariamente nessa ordem). deu pra sacar um pouco do drama dos espanhóis.
chegara à capital depois de uma noite de trem, vindo de paris. a primeira impressão da cidade, ao sair do metrô para as ruas da puerta del sol, foi ouvir um carro tocando skank. por um segundo, achei que estivesse de volta ao brasil. e saí para trocar alguns traveller's por pesetas. como era sábado, demorei um pouco até achar uma casa de câmbio aberta que não me enfiasse tanto a faca.
eis que, já de posse de algum erário, ouço um rumor surdo vindo do topo da calle mayor. uma baita passeata, pouco depois das nove da manhã. "uau!", pensei. na época, eu trabalhava para um jornal independente comunistaço aqui no rio, e era o único na redação que nunca havia participado de uma manifestação, levado uma borrachada da polícia, ou ido parar numa delegacia.
saquei minha "canonzinha" turística e larguei o dedo. quando avistei alguns reporteros, me apresentei como colega brasileño, e, com meu espanhol aprendido através de histórias e quadrinhos, almodóvar e bigas luna, pude apurar o motivo da mobilização: o eta tinha seqüestrado miguel angel blanco, político de 29 anos. em troca de sua vida, exigiam a libertação de prisioneiros bascos em 48 horas. senão, kaput!
enquanto a multidão se concentrava na puerta, conversei com algumas pessoas (meu espanhol se mostrava melhor do que eu mesmo supunha), e parti na minha jornada turística. de noite, volto. estão todos lá ainda, aos gritos de "basco, sí, ETA no!", com cartazes "basta ya!", decorados com desenhos de mãos abertas e fitas azuis. "pô, povo politicamente organizado", pensei, numa comparação besta com nosso zé povinho.
no dia seguinte, acordo. eles ainda estão lá. com o mesmo ânimo. "esses caras são duros na queda. será que vão ficar aí o dia inteiro?". museo del jamón, metrô, touradas, prado (muito mais exuto e significativo que o louvre, na minha opinião).
na volta, a mesma coisa. "não é possivel! vagabundo não tem casa! arrego...". no dia seguinte, o governo não arredou, e miguel foi mandado para a terra do pé junto. cara, baixou um manto de tristeza na cidade. até os guardinhas do reina sofía usavam tarjas de luto. não fiquei lá por muito mais tempo. me sentia um biltre por estar buscando diversão enquanto todo mundo viva uma baita ressaca moral. dali fui direto para córdoba, desperdiçando a oportunidade de ver de perto a terra do meu mestge el greco, toledo, e o escorial.
a partir de então, comecei a duvidar da legitimidade de certas formas de pressão...