23 abril 2004

arrumando a casa

troquei alguns linques, mas para aparecer, tem que bostejar um qualquer.

o braga, o mar e o livro

sempre achei difícil responder qual seria o melhor livro que já li. mas hoje, fazendo um balanço, tem um que ganharia por antigüidade. e se está comigo há tanto tempo, é porque tenho um carinho especial por ele. é o "200 crônicas escolhidas", do rubem braga, de uma edição antigona (paroxítona), do círculo do livro. digo com tranqüilidade que é a minha bíblia. braga é lírico sem ser piegas, espirituoso sem ser engraçado, emotivo sem ser dramático. um mestge, enfim.

lembro-me que assim que o vi, logo me fascinaram a cor de leite achocolatado da capa, e os tipos arredondados do nome do autor, em degradé (é assim?) vermelho. um dia, a parentada foi passar o dia no forte do imbuí, em niterói, e enquanto os outros se divertiam correndo pela praia, me atraquei com o livro sob uma amendoeira. me atraquei mesmo, porque a prosa poética era por demais abstrata para uma criança de quê?...nove anos? a briga foi feia, e perdi de lavada. já à tardinha, cansado do baile que o braga me infligiu, fui me distrair vendo uns mergulhadores (que então, por influência do desenho do johnny quest, eu chamava de "homens-rã"), e um baiacu que um amigo pescara. como ele havia engolido o anzol (o peixe, não o amigo), dávamos umas porradas com ele nas pedras, para ver se ele o cuspia. mas, para espanto de todos, ele inflou. o que foi a parte mais emocionante de todo o dia de pescaria. guardo a imagem até hoje.

digo isso porque hoje estava relendo algumas das crônicas para uma pessoa muito querida (é mulher, antes que esse papo de "pessoa" comece a dar margem a especulações sobre minha opção sexual), e por acaso topei com uma em que o "velho urso" fala da emoção de ver o mar pela primeira vez (ele, como o bob carlos, é de cachoeiro do itapemirim), numa excursão que fez, ainda menino, com um grupo de amiguinhos. depois conta de sua juventude passada à beira-mar, pescando, velejando, nadando, ou simplesmente amando sua beleza. no fim do texto ele termina falando com ele, de uma maneira que me encheu de emoção:

Este homem esqueceu, grande mar, muita coisa que aprendeu contigo. Este homem tem andado por aí, ora aflito, ora chateado, dispersivo, fraco, sem paciência, mais corajoso qua audacioso, incapaz de ficar parado e incapaz de fazer qualquer coisa, gastando-se como se gasta um cigarro. Este homem esqueceu muita coisa, mas há muita coisa que ele aprendeu contigo e que não esqueceu, que ficou, obscura e forte, dentro dele, no seu peito. Mar, este homem pode ser um mau filho, mas é teu filho, é um dos teus, e ainda pode comparecer diante de ti, gritando, sem glória, mas sem remorso, como naquela manhã em que ficamos parados, respirando depressa, perante as grandes ondas que arrebentavam - um punhado de meninos vendo pela primeira vez o mar...

Julho, 1938

22 abril 2004

confissão

tô há um tempão sem escrever, basicamente por dois motivos: 1) vivo um período muito bom, de intensa felicidade, como só poderia supor nos meus mais desvairados delírios românticos adolescentes. sem aquela melosidade piegas, mas utilizando todo o bom senso que consegui reunir ao longo desses 30 outonos. estou, pela primeira vez na vida, deixando o coração frouxo, sem que o cérebro o castigue a cada instante. dá uma certa vertigem, mas recomendo a todos. 2) vivo um período muito ruim, de intensa ansiedade, um pesadelo mesmo. confronto contra esqueletos até então sublimados. barra pesada, amiguinhos (será uma prévia do inferno astral que me aguarda em poucos dias?).

o que está bem, está bem; o que me preocupa é o resto. numa tentativa de ser menos vago, direi que o problema é mais ou menos o seguinte: tenho uma transa mal resolvida com autoridade. me amedronta e repugna, mas ao mesmo tempo, é o motor que me tira da inércia. dificilmente produzo sem pressão. com um agravante: amizade é amizade, chefia é chefia. tal água e óleo, não consigo misturá-las sem prejuízo para ambas as partes. tenho buscado alcançar um meio-termo, mas, por enquanto, ou bem estou pagando pelos pecados de adão, ou bem estou no jardim das delícias.

outra coisa é uma estranha mania de me desinteressar por qualquer assunto no exato momento em que ele se torna uma obrigação. foi assim até com o desenho. o período em que cursei a faculdade de belas-artes, foi quando praticamente abandonei as histórias em quadrinhos. desenhava, sim, mas deixei de lado minha verdadeira paixão. depois fui cair na besteira de acreditar na conversa burra e preconceituosa de que tinha que arrumar um emprego de gente grande. afinal, todo mundo sabe que esse negócio de desenhar não vai te levar a lugar nenhum...
mas isso é outra história.

tenho uma auto-crítica insana. e um medo danado de me expor ao julgamento alheio (mas não sou um cara tímido; sou do tipo que, com um pouco de inspiração e algumas latinhas na cabeça, sou capaz de fazer as pedras gargalharem. pensando bem, às vezes, não preciso nem das latinhas...). a possibilidade de críticas, ou de que descubram que não passo de uma farsa – é isso aí, gente fina, a coisa é ruim assim – me paralisa. meu nível de exigência dispara e, mesmo inconsciente, se não for para ser o melhor, prefiro declinar. até os elogios e expectativas positivas soam como cobrança.
bem-aventurados os caras-de-pau, pois deles será o mundo. não é despeito, não. é admiração.

agora misture os igredientes até formar uma massaroca, bata repetidamente na cabeça, e não dê tempo para ela descansar. deu para perceber o drama ou querem que eu desenhe?

isto posto, só me resta tocar um tango argentino, ou manter-me atento e forte, sem medo de temer a morte, porque afinal de contas, tudo é perigoso, tudo é divino maravilhoso.

pensando bem, fico com a segunda opção. i choose life. whatever the cost. que venham os tártaros. tombarei lutando.

16 abril 2004

descoberta feliz

o mundo gira, a lusitana roda, e a corda aperta-se em torno do meu pescoço à medida que o tempo escorre e aproxima-se a data fatídica da minha defesa. descontando-se o fato de que preciso de um milagre urgente, até que o buraco no meu estômago parece estar sob controle.

e ainda encontro tempo para pequenas felicidades! depois de anos, hoje afinal descobri o nome da música que toca no yellow submarine quando uma das criaturas do sea of monsters (a de luvas de box), acende um charuto que depois explode na sua cara. é a "ária na corda sol da suíte orquestral no 3 de bach. no desenho só toca um trechinho rápido, mas como sua beleza ficou impressa em mim.

em face dos últimos acontecimentos (2)

bom, agora que o secretário de segurança provou em brasília que a situação do rio não está fora de controle (sic), que a política de segurança da governadora não está indo pelo ralo, e que, ao que tudo indica, temos mesmo uma política de segurança (sic), muito me tranqüiliza saber que o tráfico na rocinha já tem um substituto para lulu. segundo comentou a "coisinha" no post passado, ele atende pela singela alcunha de zarur.

segundo a fonte, ele disse que vai retomar as operações dentro de um esquema de paz e harmonia com a comunidade. que alívio saber que tudo não passou de um pequeno desajuste comercial, e que a intervenção benéfica do estado ajudou a regularizar as atividades do mercado. e tem gente que ainda é contra o controle do estado sobre a economia!...

só mais um detalhe: para quem não sabe, o zarur original era o alzírio zarur, radialista criador da "ronda da caridade", que em 1962, distribuía sopa para os moradores de rua do rio. a iniciativa, popularmente conhecida como o "sopão do zarur", foi o embrião da legião da boa vontade (lbv). espero que a versão aditivada do zarur honre o bom nome de seu antecessor, e saia pela cidade num "bonde" do bem, servindo à população carioca o "maconhão do zarur", ou o "brizolão do zarur".

15 abril 2004

em face dos últimos acontecimentos

dudu no vidigal, lulu na rocinha; rosinha em laranjeiras, garotinho em brasília... já ouvi falar em banalização da violência, mas que tal imbecilização da violência?

se as principais figuras da cidade ainda não saíram da fase dos apelidos infantilizantes, como esperar alguma seriedade no debate político, ou resolução minimamente decente?

12 abril 2004

exorcizando velhas mágoas

costuma-se dizer que, cicatrizadas pelo tempo, as dores tornam-se risíveis. concordo totalmente. hoje, noves fora, estou por cima novamente, esbanjando felicidade. no entanto, descobri uma pérola do tim maia que me lembrou uma rasteira espetacular que levei em meados de 2000. como se sabe, há poucos com tanta propriedade para cantar dores-de-cotovelo como o tim.

se a conhecesse na época, não me abatia tanto. apesar de ser sobre traição, vale pelo registro do rancor. vamos a ela:

Sofre (Tim Maia)

Não vou mais chorar, mas se eu chorar
Vai ser baixinho pra ninguem me ver
O quanto eu sofro pois amei você
Vou seguir o meu caminho triste
Como antes de te conhecer
Porém marcado, humilhado, magoado, pode crer

Você foi mulher
Se isso é ser mulher
Está enganada, pois não é não
Isso foi pura podridão

Se valeu o sentimento puro e belo que eu tinha por você
Para fazer das suas crueldades e maldades sem perdão

Agora sofre, sofre
Todo o mal que 'cê me fez
Você bem cedo irá pagar
Disse a todo que eu que era o mal
E no entanto foi você quem riu
E quem me fez penar

momento cafajeste

passadas as estripulias de feriado, todos salvos e exangues de tão constante labuta, faço minhas as palavras de raul seixas, no lp (que museu, xará!) de estréia "krig-ha, bandolo!":

Que o meu é doce, é coisa que me nego a afirmar; mas que parece doce, isso eu afirmo plenamente.

08 abril 2004

depois de longa ausência, uma bordunada

maluco! mó tempão que não bostejo. deixei de dar minhas bordunadas porque a vida anda a mil (ou a passos de cágado, dependendo do ponto de vista, mas pressinto mudanças radicais no ar. embora ainda não as saiba para o bem ou mal, escuto o silêncio que antecede o esporro).

mesmo sabendo que "não sou nada, nunca serei nada, não posso querer ser nada" (valeu, álvaro de campos), sou um cara atento. adoro o xexéo desde os tempos do jb, ouço todo dia sua coluna com o cony e o heródoto barbeiro na cbn, mas ultimamente ele tem deixado a desejar...primeiro foi o vacilo de confundir a hilda hist com a lya luft no rádio, na ocasião do falecimento da primeira. e hoje, enquanto eu calmamente folheava o caderno zona sul d’o globo no banheiro, dei de cara com uma coluna do citado coleguinha na matéria de capa, sobre o renascimento dos cineclubes.

estranhei o título de cara: Godard, Hengel, Marx e Truffaut. peralá, Hengel????????? li a coluna. ele conta que, nos primeiros cineclubes, os debates depois dos filmes faziam a cabeça da rapaziada. e fecha com a frase:

Só que as cabeças já chegavam feitas às salas de cinema improvisadas. Não por Marx ou Hengel, mas por Godard e Truffaut.

incrível! qual um dr. frankenstein das ciências humanas, ele fundiu hegel com engels! essa foi a relação teórica mais arrojada que já vi.

ou pode ser que eu esteja fazendo piada da minha própria ignorância. dei uma googada em hengel, e descobri que existe um estudioso alemão chamado martin hengel, autor de uma obra considerada um marco nos estudos sobre o processo de helenização do judaísmo palestino, Judaism and Hellenism, entre outros livros. ok, xexéo, mea culpa, mea maxima culpa...

02 abril 2004

primeiro de abril

ver a polícia carioca prender o suposto asassino do casal de americanos zera todd & michelle staheli rendeu meu primeiro de abril. muito mal contada essa história de "caseiro do vizinho". espero que confirmem a autoria com o material recolhido sob as unhas de uma das vítimas (se é que ele ainda presta), e com o tal reagente que identifica sangue mesmo depois de a arma do crime ter sido lavada. no entanto, a polícia, por via das dúvidas, já deu o caso por encerrado. embora duvide da motivação.

de qualquer forma, ficam duas lições: 1) o pessoal do fbi não possui metade da sagacidade que vemos nos filmes; 2) muito cuidado com quem você chama de "crioulo" daqui para frente.