às vezes, quando alguém me fala de alguma tragédia, vivida ou ouvida, recordo-me da frase "por que contam coisa às criancinhas?", do livro meu pé de laranja-lima, de josé mauro de vasconcelos.
quem tem mais de trinta dificilmente não saberá a que me refiro. o romance autobiográfico, lançado em 68, fala sobre a infância pobre de um menino num subúrbio do rio. a única alegria de sua vida miserável é a companhia de um confidente imaginário, seu pé de laranja-lima.
a tristeza dilacerante do livro marcou-me desde quando o li, aos nove anos, para o colégio. de noite na cama, a cada página, dava arrancos de cachorro atropelado, que só não preocupavam em excesso minha mãe porque ela mesma já tinha sido "vítima" de zezé, do portuga e do pé de laranja-lima. foi por causa delels que descobri o que é a dor da incompreensão, da humilhação da pobreza, da perda. ali aprendi que amadurecer dói, e que, no processo, o mundo pode ser um oponente desleal. e o sofrimento, até então, estava apenas começando.
à medida que escrevo essas linhas, voltam algumas passagens do livro, despertando emoções há muito recalcadas. e mais uma vez me pergunto:
"por que contam coisas às criancinhas?"