01 abril 2008

o pastor de nuvens

vista da janela de casa depois da chuva. sem photoshop


estou me repetindo, mas no meu mundo ideal, todos seriam jorginho guinle. ou índios. ou algo entre os dois.

o que quero dizer é que no mundo perfeito que projeto na minha cabeça, um dos aspectos principais é que as pessoas só trabalhariam por prazer, já que a todos seria garantido o acesso a tudo, e o dinheiro, se não supérfluo, seria inexistente. nunca é demais exercitar a esponja intracraniana.

dentro desse espírito, há duas ocupações que gostaria de exercer. uma real e outra fantástica. a primeira seria ser palhaço de circo. gosto dessa figura ambígua que, por sua aparência bizarra e absurda, é capaz de driblar impedimentos ou punições ao ridicularizar os poderosos e apontar as verdades mais inconvenientes. por outro lado é quase escravo da obrigação de fazer os outros rirem enquanto ele mesmo chora. faria isso de graça.

a segunda ocupação que penso para mim nasceu da observação do mundo através das janelas dos aviões, e é quase felliniana, ou saída de um poema de maiakovski. pois eu gostaria de ser um "pastor de nuvens".

nada me dá mais prazer do que assistir ao espetáculo fugaz e poderoso formado pela condensação de partíclas d'água. na primeira vez que morei só, meu micro-apartamento ficava quase colado ao corcovado, bem no suvaco do cristo. as nuvens sempre se acumulavam ali, proporcionando tantas tardes belas. assim que chegava do trabalho, sentava-me num banquinho estrategicamente instalado junto ao peitoril, onde ficava até escurecer.

imaginem então meu êxtase ao estar a milhares de quilômetros acima do chão, assistindo-as de cima, mesmo encapsulado numa lata de sardinha voadora.

quem dera poder passear sobre os cirros, afastando ou juntando as nuvens da maneira que me aprouvesse, espremendo nimbos, criando formas, tingindo-as de sol ou simplesmente descansando sobre elas. não haveria felicidade maior. nem cafuné em rede ganhava.

as nuvens são feitas da mesma matéria que os sonhos (alguém já disse isso, aliás melhor que eu). meu consolo é que, a cada dia que passa, me descubro vivendo mais próximo de seu mundo.