finalmente consegui baixar mother night, filme inspirado no livro "o espião americano", do kurt vonnegut. numa semana para lá de estranha, essa foi, sem dúvida, uma das boas coisas que poderiam ter acontecido -- embora nem de longe a única. ou a melhor.
há um trecho que não lembrava, em que o personagem principal -- um escritor americano recrutado para atuar como agente infiltrado de propaganda nazista durante a segunda guerra -- descreve seu amor pela esposa.
mesmo não sendo um vinícius, drummond ou rubem braga, o texto tem lá seus méritos.
Nenhum jovem na terra é tão excelente sob todos os aspectos que não precise de um amor incondicional. Bom Deus, enquanto os jovens desempenham seus papéis nas tragédias políticas com elencos de bilhões, o amor incondicional é o único tesouro real que eles deveriam procurar.
Das Reich der Zwei, o país de dois que minha Helga e eu tínhamos –- seu território, o território que defendíamos com tantos ciúmes, não ia muito além dos limites de nossa grande cama de casal.
Um pequeno país, liso, cheio de tufos e fontes, tendo minha Helga e eu por montanhas.
E, sem que nada fizesse sentido a não ser o amor, que estudante de geografia eu era! Que mapa eu poderia desenhar para um turista de um mícron de altura, um submicroscópico Wandervögel [excursionista] andando de bicicleta entre um sinal e um cabelinho dourado encaracolado de cada lado do umbigo da minha Helga. Se a imagem é de mau gosto, Deus me ajude. Todo mundo deveria inventar brincadeiras para sua saúde mental. Eu simplesmente descrevi uma brincadeira, uma interpretação adulta de “Este porquinho” que era a nossa.
Oh, como nos apegávamos a isso, minha Helga e eu –- como nos apegávamos sem nos importar com nada!
Não escutávamos as palavras um do outro. Ouvíamos apenas a melodia de nossas vozes. As coisas que procurávamos ouvir não eram mais inteligíveis que o ronronar de gatos.
Se tivéssemos escutado mais, se tivéssemos pensado no que ouvíamos, que casal enfadonho teríamos sido. Além do território soberano de nosso país de dois, nós conversávamos como os lunáticos patriotas ao redor de nós.
Mas isso não importava.
A única coisa que contava –- nosso país de dois.
E quando esse país deixou de ser, tornei-me o que sou hoje e o que sempre serei, um apátrida.