a demora em continuar o relato da viagem ao ceará está por conta de uns palpites infelizes, que acabaram por levar meu computador a embaralhar tudo o que aparece no monitor, tornando impossível qualquer ação ou leitura.
enfim, o que eu queria dizer é que tenho me lembrado bastante da festa da taíba, a praia perto de fortaleza onde passei o segundo melhor reveillon da minha vida. o primeiro foi involuntariamente sozinho na casa da minha mãe, assistindo a um festival dos irmãos marx na tevê a cabo. distraí-me com os filmes, e só dei por mim quando os fogos começaram a espocar.
não a vi de dia, mas afirmo que a taíba tem a noite mais estrelada e bonita do mundo. mais até do que jericioacoara, para onde fui alguns dias depois. se bem que meu julgamento pode ter sido influenciado pelos fogos e as vibrações da ocasião. vibrações, aliás, em grande parte proporcionadas pelos anfitriões, em especial a marreca, a figura iluminada que a gabi tem como mãe.
a simpatia com que recebeu a mim e outros desconhecidos foi tão grande que não havia como não se sentir bem-vindo, aconchegado e, arrisco dizer, fundamental ali. pouco antes da virada, recebemos rosas e palmas para ofertarmos à iemanjá, e rumamos em fila para a praia, segurando uma corda puxada por ela, que nos explicava ser "o fio que nos une".
de frente para o mar, sob a escuridão quase total, uma doce melancolia tomou conta de mim, e aproveitei para me afastar um pouco e refletir. pensei em perda, solidão e amor ao próximo. mas não estava triste, e sim confortado comigo mesmo e feliz por estar pulsando na mesma freqüência que todos. um estado de espírito parecido com o que senti no carnaval do ano passado.
outra lembrança que permanece, igualmente forte e querida, é a do quase desvario dançante causado pela qualidade do som comandado pela júlia lopes. só que, mais que os pontos de macumba-palavrão do otto, o que não desgruda da mente é a canção lourinha americana, do mestre laurentino, que sabe deus em que furna obscura do passado a ouvi pela primeira vez. isso é que é eterno retorno, o resto é onomatopéia de espirro.
essa lourinha americana
está querendo me esculachar
foi dizendo que eu sou neguinho, e bem neguinho
e lá na américa eu não posso entrar
mas o que eu mais me admiro
é de ver o americano
quando chega no brasil, no brasil
com negro vem se misturar.
mas o que mais eu me admiro
de eu ser um nego brasileiro
e estou noivo pra casar com uma lourinha
e ela é filha de estrangeiro.