30 junho 2007

machadiana

"folhas misérrimas do meu cipreste",
não se preste
não se empreste
a vida, vide,
não é um teste.
"heis de cair".

28 junho 2007

o mundo não perdoa

num desdobramento do caso sirley, o pai de um dos envolvidos, ao sair da polinter, declarou:

Minha vida acabou, e a do meu filho também. Quem vai dar emprego para ele?

caro seu ludovico [é o nome do cara], a única lição que o senhor deveria ter dado para o seu filho, a mais basal e ao mesmo tempo mais importante para o convívio em sociedade, a única que separa o ser humano das bestas, é a responsabilidade pelos próprios atos.

isso claramente não foi ensinado. agora, como dizia minha mãe, o mundo vai ensiná-lo.

e o mundo é um professor severo. cqd.

ode ao trabalho

não gosto de trabalhar. ponto.

gosto, sim, de viver. ler, ir ao cinema, passear, desenhar, beber, bater papo com os amigos, me vestir confortavelmente, comer bem e ter mobilidade - seja viajar ou ter livre acesso para freqüentar os lugares que me apeteçam. e se a regra do jogo estipula que para eu realizar minhas vontades, eu precise de dinheiro, e principalmente, que para ganhá-lo eu precise trabalhar, assim o farei.

posso então afirmar que o único motivo que me faz acordar de manhã, me arrumar, tomar um ônibus e perder oito horas do meu dia esquentando uma cadeira em frente ao computador, engordando e cultivando uma tendinite no braço direito, é grana.

alguns me perguntam, de olhos rútilos (obrigado, nelson rodrigues), se não busco satisfação ou realização no trabalho. a esses respondo, fatal como um tiro de fuzil: não. realização eu vou ter nas atividades que enumerei no primeiro parágrafo. no trabalho, não.

não alimento a menor ilusão de alcançar qualquer forma de prazer com o trabalho. trabalho é trabalho, prazer é outra coisa. está na bíblia. o oposto do paraíso é o trabalho. o máximo de pretensão profissional que almejo é ter o mínimo de aporrinhações.

agora, não gostar de trabalhar não significa que enquanto estiver gastando minha vida dentro de um escritório, não farei tudo que seu mestre mandar da melhor maneira possível. e isso é o ápice da coerência, pois mais do que ao trabalho, tenho ojeriza a aborrecimentos. se me exigirem iniciativa, terei iniciativa. se me cobrarem criatividade, assim o serei. se nada pedirem, mas sempre pedem algo. e eu dou.

se não gosto de trabalho, abomino igualmente tudo o que faça parte de seu ambiente ou se relacione a ele. por isso não gosto de fofocas de corredor, boatos e antecipações. tento não sofrer angústias. e como estou longe de ser um camarada depressivo, é bem verdade que no meio dessa sarabanda, tento me divertir, para não transformar tudo em calvário.

sou fascinado por gente, sua beleza e sua miséria. portanto, trato a todos com educação e equanimidade. eventualmente faço alguns amigos. como todos os outros que já passaram por mim, alguns ficam. mas nem quanto a isso tenho pretensão.

e para terminar esse texto, que já nem eu agüento mais, deixo um trecho do antigo testamento que aprendi hoje. não sei se o que reproduzo condiz com a mensagem bíblica, mas me vale agora. livro de eclesiastes, capítulo 2, versículos 22 a 26.

22 Pois, que alcança o homem com todo o seu trabalho e com a fadiga em que ele anda trabalhando debaixo do sol?

23 Porque todos os seus dias são dores, e o seu trabalho é vexação; nem de noite o seu coração descansa. Também isso é vaidade.

24 Não há nada melhor para o homem do que comer e beber, e fazer que a sua alma goze do bem do seu trabalho. Vi que também isso vem da mão de Deus.

25 Pois quem pode comer, ou quem pode gozar, melhor do que eu?

26 Porque ao homem que lhe agrada, Deus dá sabedoria, e conhecimento, e alegria; mas ao pecador dá trabalho, para que ele ajunte e amontoe, a fim de dá-lo àquele que agrada a Deus. Também isso é vaidade e desejo vão.

22 junho 2007

pára tudo!

sabe cotidiano, do chico buarque?

pois é, o lessa me apresentou uma música que, na minha concepção, seria a "visão" do raul seixas.

É fim de mês

É fim de mês, é fim de mês, é fim de mês, é fim de mês, é fim de mês!

Eu já paguei a conta do meu telefone,
Eu já paguei por eu falar e já paguei por eu ouvir.
Eu já paguei a luz, o gás, o apartamento
Quitinete de um quarto que eu comprei a prestação
Pela caixa federal, au, au, au,
Eu não sou cachorro não (não, não, não)!

Eu liquidei a prestação do paletó, do meu sapato, da camisa
Que eu comprei pra domingar com o meu amor
Lá no Cristo, lá no Cristo Redentor, ela gostou (oh!) e mergulhou (oh!)
E o fim de mês vem outra vez!
E o fim de mês vem outra vez!

Eu já paguei o peg-pag, meu pecado,
Mais a conta do rosário que eu comprei pra mim rezar ave maria.
Eu também sou filho de deus
Se eu não rezar eu não vou pro céu,
Céu, céu, céu.
Já fui pantera, já fui hippie, beatnik,
Tinha o símbolo da paz pendurado no pescoço
Porque nego disse a mim que era o caminho da salvação.
Já fui católico, budista, protestante,
Tenho livros na estante, todos têm a explicação.
Mas não achei!

Eu procurei!
Pra você ver que procurei,
Eu procurei fumar cigarro hollywood,
Que a televisão me diz que é o cigarro de sucesso.
Eu sou sucesso! eu sou sucesso!
No posto esso encho o tanque do meu carro
Bebo em troca meu cafezinho, cortesia da matriz.
"there's a tiger no chassis"...

Do fim do mês,
Do fim de mês,
Do fim de mês eu já sou freguês!
Eu já paguei o meu pecado na capela
Sob a luz de sete velas que eu comprei pro meu senhor
Do bonfim, olhai por mim!
Tô terminando a prestação do meu buraco, do
Meu lugar no cemitério pra não me preocupar
De não mais ter onde morrer.
Ainda bem que no mês que vem,
Posso morrer, já tenho o meu tumbão, o meu tumbão!

Eu consultei e acreditei no velho papo do tal psiquiatra
Que te ensina como é você vive alegremente,
Acomodado e conformado de pagar tudo calado,
Sem bancar o empregado sem jamais se aborrecer...
(Ele só que, só pensa em analisar, na profissão seu dever é adaptar, ele só que só pensa em adaptar, na profissão seu dever é adaptar)

Eu já paguei a prestação da geladeira,
Do açougue fedorento que me vende carne podre
Que eu tenho que comer,
Que engolir sem vomitar,
Quando às vezes desconfio
Se é gato, jegue ou mula
Aquele talho de acém que eu comprei pra minha patroa
Pra ela não me apoquentar,

E o fim de mês vem outra vez...

quase um haicai

hoje completo
um mês sem computador
com puta dor...

21 junho 2007

carne nova no pedaço!

tem blog novo e bão aí do lado: foreign mama, da judith. amiga de outros carnavais, hoje sabe a dor e a delícia de ser mãe de guri pequeno em san francisco. tá em inglês, mas tem versão em português, embora ela não a atualize. sabe como é, o moleque é exigente...

o eric, meu colega de trabalho e cada vez mais amigo de infância, fala para o mundo direto do trem. o cara é tão bom de ler quanto o lessa, que também sua com a gente para tirar o pão, e ainda tem que me aturar ao seu lado todo dia.

o último, ms não menos importante, é uma receita que leva um monte de jornalista fera e doses cavalares de inteligência e ironia embebidas em uísque. misture tudo, chacoalhe a cabeça, e o resultado será uma sopa de tamanco que é, como eles dizem, pau puro!

saboreiem sem moderação!

Âpideite:
Esqueci de citar a deborah e o tom. eles se conheceram, namoraram, casaram, engravidaram, foram morar nas estranjas, e fizeram um blog. até o presente momento, o lucas ainda não nasceu...

19 junho 2007

no meio do caminho tinha uma pedra do reino

sou fã do ariano suassuna desde os 14 anos, quando, ainda aluno do colégio militar, fui obrigado a ler o auto da compadecida. outro dia, uma amiga até apontou a ironia do fato: uma instituição que prima pela seriedade marcial incluir em seu conteúdo programático uma obra tão irreverente.

talvez eles estivessem vendo adiante, porque além deste livro e dos já manjados machados (dom casmurro, o alienista e quincas borba), tive contato com o socialismo cristão de érico veríssimo (olhai os lírios do campo), o naturalismo contundente de aluízio azevedo (o cortiço), além de um volume de contos de diversos autores, que incluía, entre outros, mario de andrade (o peru de natal) e aníbal machado (a morte da porta-estandarte).

voltando ao mestre ariano, seu livro em nada me atraiu: a capa não denunciava nada de seu conteúdo, e a palavra "auto" não fazia parte do meu repertório lingüístico. compadecida eu até sabia o que era, mas esse diabo de "auto" era fogo. e tudo era estranho: a linguagem, os personagens ("chicó"?! porque não "chico"?!) e as situações (enterro de cachorro?!). acho que só fui entender a ironia quando fui fisgado pelo episódio do gato que descome dinheiro. a partir dali, nascia para mim um clássico absoluto.

de lá para cá, minha admiração pelo autor só aumentou. devorei e assisti a várias montagens desse e de outros títulos, e até consegui trocar duas palavras com o autor ao praticamente esbarrar com ele numa bienal de são paulo ("a mim me impressionou muito a obra de klee. e pode botar aí que gostei muito da tauromaquia do picasso", disse o mestre a um assombrado marcelo, então estudante de jornalismo que cobria a exposição para um jornal comunista). o auge foi a leitura d'o romance da pedra do reino, numa edição encontrada num sebo do catete, depois de muita sola de sapato gasta. já reli o tijolo uma vez, e pretendo repetir a dose em breve.

por isso, esperei com muita ansiedade e expectativa a transposição para a telinha da história de dom pedro dinis quaderna, o decifrador. na noite de estréia, me reuni a um grupo de pessoas na casa de uma amiga arianófila. estava ciente de que luis fernando carvalho não é guel arraes. enquanto este consegue um equilíbrio perfeito entre obra comercial e artística, o primeiro tem lá seus fumos autorais. à parte isso, considero lavoura arcaica uma pequena jóia do cinema de todos os tempos.

mas na minha humilde opinião, na pedra... ele errou a mão feio. muitas informações visuais e sonoras ao mesmo tempo, com um monte de close-ups que acabavam prejudicando o trabalho de corpo dos atores, cenários e figurinos, além do excesso de cortes "videoclípicos", que deixavam a continuidade narrativa muito quebrada. a história, que já não é muito acessível, foi muito prejudicada, e deve ter assustado muita gente à espera das estripulias de um outro joão grilo.

o resultado me deixou tão decepcionado que nem tive ânimo de ver os outros dias. mas não fui só eu. na coluna do ancelmo gois (a quem tarso de castro acusou de ser "analfabeto até no nome"), leio que o gravador j. borges faz coro comigo. reproduzo a nota:

Enviado por Ancelmo Gois - 16.6.2007| 20h17m

Ariano Suassuna

J. Borges: Pedra do Reino não tem nada de Nordeste

O xilógrafo J. Borges, considerado o melhor do Nordeste, na opinião do amigo Ariano Suassuna, não viu e não gostou da versão televisiva de "A Pedro do Reino":

- Vi apenas o comercial porque o programa passa muito tarde. Mas ouvi vários comentários. Eles fizeram uma coisa que nem parece ter sido feita no Nordeste. Parecem umas figuras romanas. Muito esquisito, muito feio. Aquilo não tem nada do Nordeste. O povo aqui está dizendo que não se encaixa bem com o livro.

18 junho 2007

balada para seu geraldo

rapaz, tenho andado numa preguiça monstruosa.

desconfio que a razão tenha sido o abandono temporário da ioga, fruto de uma súbita e inesperada falta de grana, que me levou à alguma descompensação físico-química.

é bem verdade que o computador queimado também pode ter colaborado, já que, como "webdependente", sem acesso à rede eu não acho nada engraçado, macaco, praia, carro, jornal, tobogã, eu acho tudo isso um saco...

ainda teve um caso que mexeu comigo. no dia do meu aniversário, um camarada do trabalho me mostrou um site de biorritmo, apresentado como exemplo numa apostila do curso de java que ele está fazendo.

na maior boa-intenção, o caboclo digitou minha data de nascimento e voilá!, o resultado pelos quinze dias seguintes era uma curva descendente até o zero nos quesitos saúde e grana.

dei uma risada cética, mas batata! dali a dois dias perdi meu cartão de débito do banco, e estou até hoje num "gripa-não-gripa" que me levou ao ponto de ir à farmácia comprar xarope, coisa que não faço há uns quinze anos.

enfim, meu ânimo tem andado meio down the high society, por mais que meu hemisfério palhaço não demonstre a fraqueza...

o caso anda tão crítico que nem perna bem-feita de moça tem me tirado da letargia.

entretanto, nos últimos dois dias, devo ter ouvido algum indiano encantador de serpentes, porque a curva aos poucos tem dado sinais de vida.

sábado eu varri os dois dedos de poeira e "cabelhos" acumulados pela casa, que já conspiravam para me despejar. ontem limpei o banheiro, lavei roupa & louça e, pasmem!, fui dar um "chêgo" na praia.

nesse passeio senti um daqueles momentos mágicos de solitude absoluta que me levam a um estado de comunhão com tudo e com todos.

talvez deus seja um troço tão bom quanto isso.

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enrolei até aqui, mas meu objetivo era contar uma cena que presenciei, e que despertou lembranças muito profundas de criança. em determinado momento da caminhada, passaram por mim um jovem pai e seu filho de uns onze anos.

eles vinham pela pista fechada da praia, tocando uma bola de futebol. o garoto, de chinelos, ia mais à frente, e apresentava bastante desenvoltura com a pelota, apesar do calçado inadequado.

o fato lembrou-me de quando eu batia bola com os garotos da mesma idade, no playground do meu prédio, na gávea. desde aquela época, eu já não levava muito jeito para futebol, mas ainda tentava, para não ficar de fora da brincadeira.

uma vez, voltávamos meu pai e eu de uma praia domingueira, e me juntei à molecada num jogo de "golzinho" (era esse o nome?).

meu pai, orgulhoso, queria ver o filho honrar a linhagem -- ele próprio um peladeiro bem razoável. e pediu para que eu subisse para trocar os chinelos por tênis. desde então já consciente da mediocridade do meu futebol, eu não dava a mínima, queria era me divertir. mas ele tanto insistiu que eu subi.

e a interrupção me tirou todo o prazer de continuar. mesmo assim, voltei para agradá-lo.

é curioso como hoje identifico esse episódio como a última vez que tentei me esforçar para jogar bola. nunca mais quis bater bola, talvez como uma vingança infantil inconsciente.

hoje não consigo sequer fazer um passe decente, mas graças ao meu pai tornei-me um leitor compulsivo, um desenhista desenvolto, um jornalista bom de papo e de copo (para seu desespero), e que não é exatamente um fracasso com as mulheres.

mesmo sem o futebol, ele nunca deixou de demonstrar orgulho por mim.

obrigado, pai.

12 junho 2007

promoção ou ameaça?

juro que vi escrito num anúncio de ponto de ônibus:

"Compre com os cartões Bradesco e vá conhecer todos os segredos de Salvador com a Preta Gil"

medo.